quarta-feira, 23 de outubro de 2013

Memórias sentimentais de Buenos Aires - Parte 2 - El Angel de Morón

Desculpem meus amigos argentinos mas confesso que tive medo: em 2012, em minhas férias de inverno, um dos passeios que queria fazer era ao Museu de Aeronáutica localizado na Base Aérea de Morón e deveria ir de trem, saindo da Estação do Retiro, ir até o Once e depois até a estação de trem, chegando até o museu, de ônibus. Tinha as minhas preocupações em relação ao trem, principalmente ao chegar e sair da estação do Once, já que estava vivo em minha memória o terrível acidente que vitimou 51 pessoas.
Isso sujeitou à minha namorada a dar a maior prova de amor que uma namorada que mora ou é buenairense pode dar a um namorado: ir à Morón de ônibus. Façamos justiça ao coletivo: era confortável mas à partir de Palermo (creio que era Palermo ainda) percorremos uma boa parte desse lado portenho e confesso que percorremos lugares onde não chegaríamos por outras vias como Liniers e o Estádio do Velez Sarsfield, La Matanza e finalmente Morón , onde, tendo descido na Base Aérea, descobrimos que havia mais 300 ou 400 metros à percorrer.
El Angel de Morón
À Denise não sei se a visita ao menos interessou ou agradou mas à mim, alguém que se poderia chamar encantado pela aviação militar e especialmente por Malvinas, foi uma grande visita e a repetiria depois se o Museu não se encontrasse em reformas. Por mais que fosse compensadora, de repente me abateu uma pouquíssima vontade de fazer o mesmo trajeto de ônibus e talvez , inconscientemente e apesar do medo, tive vontade antropológica de andar de trem, algo que minha mãe e meu pai fizeram e eu nunca havia feito.
Não nego a tensão misturada ao interesse das estações que se sucediam , uma atrás da outra até que na estação de Caballito, lembro-me muito bem, entrou uma pessoa no trem e distribuiu um pequeno papelzinho com um anjo da guarda e como sou alguém que costuma atribuir significado às coisas que me acontecem,
senti aquele anjo como se viesse para confortar-me em angústia, abreviar-me a ansiedade e indicar-me que , de alguma maneira, tudo iria bem.
O rapaz, creio que era um rapaz, passou recolhendo a “contribuição” devida e dei uma moeda de dois pesos, pouco eu sei, no entanto não iria devolver o meu anjo da guarda já que, mais de uma imagem, quando nos colocamos sob a proteção de um emissário de Deus, ele nos pertence e bem assim diz a oração no verso do papelzinho que está reproduzida nesta postagem.
Chegamos ao Once, desembarcamos já na noite portenha e senti-me em paz em um primeiro momento e , em outro, pensando que seria muito sacana de minha parte atribuir ao meu anjo a minha chegada em segurança já que pensar que ali faleceram 51 pessoas e , em um segundo acidente, machucaram-se mais 80, restaria perguntar se os anjos deles estavam cochilando ou não existem.  Quem crê, como eu, sabe que eles existem, nos inspiram e protegem mas não podem evitar os desígnios da vida.

Desde então o “Angel de Morón” habita minha carteira, meu coração e minhas lembranças de dias felizes que esperamos que voltem a acontecer no futuro. Amém!

quarta-feira, 16 de outubro de 2013

Minhas memorias emocionais de Buenos Aires - Parte 1 - Introdução

Existem vários que me perguntam de onde vem esse meu verdadeiro amor pela Argentina e por Buenos Aires que custa a muitos acreditar. Seria inútil explicar-lhes que o meu amor pela capital da Argentina só pode ter vindo pelo amor à uma pessoa e ao amor que vive por todas aquelas ruas, lugares e situações.
Não vivi aquela cidade e país como um turista (isso fiz muitos anos antes) mas como alguém que foi feliz por ser e por estar. O turista tem memórias, tenho memórias e sentimentos ; para turistas as ruas e os lugares são lugares onde estiveram, para mim são lugares donde nunca saí; para o turista, já foi, eventualmente se volta, acabou mas para mim, eu nunca voltei, sigo lá, sei descrever as pedras que pisei em San Telmo, a praça do horror em Arroyo e Suipacha, o sabor do yogurt, do leite, da carne, do pão, a força do sentimento que se construiu e, mesmo sem já existir, está e estará.
A conexão , portanto, é a conexão de quem foi e é feliz pelo que viveu e viverá porque sempre vou estar em coração e , se Deus permitir, estarei em corpo sendo que por mim estaria mas algumas linhas traçadas diferentes adiam os planos.
Seja como for, as minhas lembranças serão sempre tingidas de um amor que é meu mas sei que é de muitos e é bom que assim seja porque não me dá a tentação egoísta de achar que isso é original ou meu próprio.